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Tribuna do Norte - 09/03/08 :: O CONTRASTE DA VIZINHANÇA EM PONTA NEGRA

Ponta Negra: terra em metamorfose

Repórter: Marcelo Hollanda
Foto: Rodrigo Sena

URBANISMO - Favela Peão está localizada bem ao lado de um condomínio de luxo

Espremida entre um terreno particular, uma área de propriedade da Aeronáutica e um condomínio de casas de alto padrão, o símbolo do crescimento imobiliário de Ponta Negra ou o que restou dele tem nome: favela do Peão.

Como todo o resto do bairro que nos últimos anos foi o preferido dos investidores estrangeiros, o aglomerado de barracos comprimido ao longo de uma estreita ruela aberta na duna é bem anterior aos prédios que compõem o atual cenário urbano de Ponta Negra.

Em meio ao conforto da tevê a cabo, da internet, dos bares, restaurantes e da beleza oceânica, o aglomerado erguido com madeiras velhas e alguma alvenaria caiada toma tudo o que precisa emprestado, água e luz.

>>> Comentário pertinente: Ninguém explica nada direito na Caern ou na Semurb, os empresários continuam ávidos e a comunidade espremida! No meio disso tudo alguns ainda lutam a favor...

Ali, deve haver perto de 38 famílias - mas, sinceramente, ninguém nunca contou. Sabe-se que por pressão do condomínio residencial contíguo, houve uma tentativa de remoção dos barracos no ano passado - inutilmente.

Esta semana, a favela do Peão foi visitada por Lúcia Moraes, relatora nacional para os Direitos Humanos, Moradia e Terras Urbanas da ONU. Entre outros congêneres melhorados, como a favela do Maruim, a Peão agora é um exemplo internacional de como o crescimento urbano não deve acontecer.

É um símbolo remanescente das Zonas de Proteção Especiais (ZPEs) e das Zonas de Proteção Ambientais (ZPAs) como a do Morro do Careca, celebrizada em 2006 pela decisão do prefeito de cassar licenças já concedidas para a construção de prédios naquela área. Juntos, Favela do Peão e os esqueletos de empreendimentos cassados são memoriais de uma batalha pela posse da terra. Um embate que transformou completamente a paisagem de Ponta Negra, mas deixou escombros para contar a história.

Caio Marcelo dos Anjos Veras, primeiro secretário do Conselho Comunitário da Vila de Ponta Negra, há 16 anos na comunidade, lembra as mudanças no ambiente do bairro de dois ou três anos para cá. “Foi uma metamorfose assombrosa, nunca se viu algo tão rápido como o que aconteceu por aqui”, afirma ele referindo-se à expansão do paredão de concreto erguido em Ponta Negra.

Dos 140 projetos imobiliários na fila de aprovação na Semurb, não se sabe exatamente quantos, por serem anteriores, livraram-se das exigências do Plano Diretor de Natal, atualizado no ano passado. Deve ser a maioria a julgar pela quantidade de obras iniciadas ao longo da Engenheiro Roberto Freire e Rota do Sol.

Segundo Caio dos Anjos, a venda de terrenos continua mais timidamente, pelo menos na Vila de Ponta Negra, uma ex-comunidade de pescadores hoje com cerca de 25 mil habitantes. Assolada pelo tráfego de drogas, mas com um índice de violência inalterado no último ano, a Vila organiza-se por direitos específicos de seus habitantes, como mais transporte e vagas em creches e no ensino fundamental.

Bairro vive problemas crônicos

É como se abrissem a passagem da mangueira e alguém, na outra ponta, comprimisse a saída da água para conter o fluxo. Resultado - pressão, muita pressão. Essa é a realidade de Ponta Negra, o bairro que há três anos está sob balanço por parte da Prefeitura, enquanto se arrastam soluções para resolver o crônico problema do esgotamento sanitário do bairro.

A mão que colocou Ponta Negra sob contenção é a do prefeito Carlos Eduardo, em seus últimos meses no cargo. Ele acaba de reafirmar que não autorizará nenhuma nova construção enquanto os problemas sanitários persistirem.

Nesse papel, ele protagonizou, em 2006, verdadeiras batalhas com a construção civil. Cassou licenças já concedidas no entorno do morro do Careca. E, ainda, luta para conter o apetite da especulação imobiliária na Zona Norte. Tudo porque a infra-estrutura de saneamento básico não acompanha o ritmo do crescimento de Natal.

O problema do esgotamento sanitário em Ponta Negra atinge especialmente as avenidas Roberto Freire, Erivan França; uma área adjacente dos conjuntos Ponta Negra e Alagamar. Nessas áreas, segundo Sinduscon, o metro quadrado médio em 2006 já chegou a R$ 6 mil. Hoje, custa em média R$ 3,5 mil.

Quando as últimas obras licenciadas antes do Plano Diretor de 2007 estiverem concluídas, a valorização será bem outra. Afinal, não serão mais permitidas em Ponta Negra construções com mais de quatro pavimentos em Zonas de Proteção Ambiental.

A polêmica sobre a saturação do sistema de esgotamento sanitário no bairro, começou no início de 2005. Durante inspeções, os promotores constataram o extravasamento do esgoto através dos poços existentes no calçadão da praia. Perceberam que o sistema de esgotamento projetado para comportar 5 mil pessoas para as três bacias recebia esgoto de uma população flutuante de 7.500 pessoas.

O sistema foi elaborado em 1996 e executado em 2000 com projeção para manter-se até 2016. Não deu – o colapso chegou antes. E, no começo de 2005, não suportou a demanda gerada pelos hotéis. Para o diretor de Marketing do Sindicato da Indústria da Construção Civil, Carlos Luiz Cavalcante, o problema é tão grave que recoloca em pauta investimentos privados para financiar obras de infra-estrutura. “A Caern não tem condições de investir? Investimos nós, os empresários”.

Problemas viários estão longe de serem resolvidos

O secretário estadual de Infra-estrutura, Adalberto Pessoa, diz que os problemas viários de Ponta Negra, como a sobrecarga de veículos na avenida Roberto Freire, só serão resolvidos depois que drenagem e esgotamento sanitário do bairro forem página virada. Mas desde 2005 não se supera esse capítulo. “Antes disso, esqueça”, assegura ele.

Para o secretário, que também é presidente do CREA/RN, Natal experimenta hoje o que muitas cidades norte-americanas viveram nos anos 60 - a idéia de que é possível crescer à base de um automóvel por habitante. “Ninguém consegue planejar uma cidade dentro desse modelo, com dois mil carros entrando no trânsito todos os meses”, afirma ele.

Para o secretário, a Avenida Roberto Freire, que é uma das mais importantes vias de escoamento de Natal, requer soluções integradas e pesados investimentos. “Isso vai mexer com a vida de muita gente, implicará em desapropriações, viadutos, passagens de nível e túneis”, diz.

Não se trata de uma solução isolada, na opinião do engenheiro. É tema a ser compartilhado entre os governos estadual e municipal com o Dnit, o órgão federal que sucedeu o DNER.

“Fizemos intervenções que custaram relativamente barato na Via Costeira (R$ 130 mil) para aumentar a fluidez do trânsito e conseguimos. Agora precisamos debater mudanças para toda a Zona Sul de Natal”, afirma.

Desconfiança em pauta

A promotora do Meio Ambiente, Gilka da Mata, por exemplo, tem entre suas convicções a de que a Caern é uma empresa obsoleta. Padece de falta de condições culturais e estruturais para planejar o futuro do saneamento básico.

Já nos corredores da companhia estadual o ressentimento que exala é contra o Ministério Público. Entre as acusações, a de que os promotores nada falam da contaminação produzida por poços particulares clandestinos que servem hospitais, restaurantes e prédios de alto padrão da cidade. Hoje, só em Natal, eles já somam mais de mil - muitos construídos anteriormente à Lei que proíbe poços subterrâneos onde exista uma companhia em condições de prover o abastecimento.

A promotora Gilka da Mata se defende. Para ela, a Caern não fornece nem quantidade nem qualidade de água e seria temerário investir no fechamento de poços sem oferecer um serviço que amparasse adequadamente essa substituição.

“Nada explica condutas da Caern, como o freqüente uso de materiais inadequados em suas obras e a falta de um plano diretor de saneamento para Ponta Negra”, acusa.

Alguns empresários do segmento imobiliário ouvidos esta semana pela TRIBUNA DO NORTE consideraram importante incorporar Parcerias Público Privadas ao esforço de resolver o problema de esgotamento sanitário em Ponta Negra. Esse posicionamento é, de certa forma, apoiado pela promotora do Meio Ambiente e por um número crescente de empresários da construção civil com obras paralisadas na área.

Semana passada, o prefeito Carlos Eduardo descartou completamente a idéia apoiada pelo Sinduscon de terceirizar o trabalho de licenciamento de novos projetos imobiliários. O prefeito mandou outro recado: enquanto persistirem os problemas ligados ao saneamento básico, não aprovará nada em Ponta Negra.

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