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Matéria TN 3/4 - Novo Plano Diretor faz de Ponta Negra área de proteção

Novo Plano Diretor faz de Ponta Negra área de proteção

Repórter: Jacson Damasceno
Foto: Divulgação

VILA DE PONTA NEGRA - Deverá passar pelo mesmo processo que passou Mãe Luíza, tudo para preservar a área e evitar a expulsão dos moradores

Ponta Negra, no planejamento urbano da capital, é quase toda considerada como Zona de Adensamento Básico. Essa classificação significa que a área possui critérios para os tipos de construções que serão erguidas. Um deles é o coeficiente de aproveitamento de 1,8 (número pelo qual se multiplica a área do terreno), definindo a área do que se pode construir em cada espaço.

Em uma Zona Adensável, os critérios são bem mais abertos. O coeficiente de aproveitamento, por exemplo, é de 3,0. É exatamente a característica do polígono criado em 2000, entre o conjunto Ponta Negra e parte de Alagamar. Com isso, grandes prédios puderam ser erguidos na região. Mas os moradores da área não gostaram nada da situação e uma mudança está sendo planejada com o novo Plano Diretor.

Segundo a chefe do Departamento Urbanístico e Ambiental da Secretaria de Meio-Ambiente e Urbanismo (Semurb), Florésia Pessoa, o novo PDN deseja corrigir o que ela classifica de falhas. Pela nova proposta, toda a área de Ponta Negra se tornará de Adensamento Básico. Com exceção da Zona Especial de Interesse Turístico (ZET), que vai da avenida Engenheiro Roberto Freire até a beira-mar (e onde se encontra a área non aedificandi), das Zonas de Proteção Ambiental (ZPA-5 e ZPA-6) e da Vila de Ponta Negra, que deverá ser transformada em Área Especial de Interesse Social (AEIS).

“O plano diretor deseja rever algumas questões, no intuito de melhorar a urbanização de todo o bairro”, disse Florésia. Segundo ela, a ZET deverá ser ampliada até a Vila de Ponta Negra, corrigindo uma falha de planos anteriores que deixaram a área desprotegida. A ZET tem critérios rigorosos para edificações. A Vila de Ponta Negra deverá passar pelo mesmo processo por que passou Mãe Luíza e, com isso, espera-se conter a especulação imobiliária, mantendo os moradores originais na área. “É preciso se preservar as mesmas características. Queremos evitar que os moradores da Vila sejam expulsos”.

De acordo com a chefe de planejamento, é preciso rever também a situação de Lagoinha, cujos padrões foram alterados recentemente. “Temos seis meses para refazer tudo aquilo”.

Morador relata que o sossego na Vila já não existe mais


Dimirson Holanda, 65, militar reformado, mora no conjunto Ponta Negra desde 1978, quando chegaram os primeiros moradores. Na época, ele fez um esforço, juntou um dinheirinho e comprou uma casa na área que na época prometia ser um paraíso dentro da capital. E de fato, por muito tempo foi. Mas Dimirson conta que de uns anos para cá, o sossego foi embora. Pois o que era um conjunto habitacional está se tornando um centro empresarial.

“Antigamente nossos filhos iam à praia à vontade. Hoje nós não temos mais isso”, conta o militar reformado. Segundo ele, a construção de grandes prédios está tirando do conjunto suas características originais. Ele cita ainda os estudos que apontam que, os espigões que ainda podem ser construídos, servirão como um paredão, na região que funciona como um corredor de vento para toda a cidade. “Se isso acontecer, vai prejudicar não só o conjunto”.

Dimirson hoje é secretário da Associação dos Moradores de Ponta Negra e Alagamar (Ampa) e hoje está unido ao professor de capoeira Caio dos Anjos, 39, secretário do Conselho Comunitário do bairro. Caio mora na Vila de Ponta Negra há 16 anos e faz um trabalho social com os jovens carentes da comunidade. Hoje, o mestre também é contra a especulação imobiliária.

“São vários problemas que temos aqui. Já acontece, por exemplo, de moradores venderem suas casas por altos preços e saírem da vila. Só que, sem saber administrar o dinheiro, muitos voltam para cá e vão morar nas favelas”, explicou. Segundo Caio, a comunidade perde também porque nem mesmo a Prefeitura pode comprar um terreno na Vila para aumentar uma escola pública, por exemplo. “Tem um terreno aqui, que já aprovamos para a compra, para a ampliação de uma escola. Mas o lote vale no máximo, R$ 15 mil, e o dono está pedindo R$ 180 mil”, conta.

Construtores criticam a falta de infra estrutura

Para o presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinducon-RN), Sílvio Bezerra, um ponto deveria ser visto antes de toda e qualquer discussão sobre construções em Ponta Negra: a falta de um adeqüado saneamento da área. Para os empresários, é um absurdo que uma região valorizada e viável como aquela ainda padeça com os problemas vistos com a incapacidade da rede de esgotos.

“O que limita o crescimento de Ponta Negra é a falta de saneamento básico. Isso limita a entrada de novos empreendimentos. Silvio se refere à capacidade da rede de esgotos, que seguiu as projeções da Companhia de Abastecimento de Água e Esgoto (Caern), mas que não previu o crescimento acelerado do bairro. “Essa é uma responsabilidade do poder público. Mas se o governo não tiver recurso, a iniciativa topa fazer uma Parceria Público-Privada para resolver o problema”.

Além da discussão sobre a adeqüação do saneamento da área, os construtores estão cobrando uma regulamentação clara e definitiva sobre as construções no bairro. Ele cita como exemplo a legislação na área da Ladeira do Sol, no Centro, onde deve-se respeitar a visualização de um observador, levando-se em conta a Fortaleza dos Reis Magos ao lado esquerdo, e o início da Via Costeira ao lado direito.

Claro que, em se tratando da criação de uma regulamentação, os construtores preferem que isso se dê no sentido das permissões. Para Silvio Bezerra, não há sentido em se proibir construções à esquerda da avenida Engenheiro Roberto Freire. “É importante se preservar a visão do Morro do Careca. Ele é um patrimônio nosso e importante até mesmo para o turismo. Mas não há sentido em se proibir que se construa ao lado direito e ali por trás (na região do conjunto)”, argumenta o empresário.

Bezerra criticou ainda a proposta existente para o novo Plano Diretor, que diz que, para que se construa na área, seja necessário obter autorizações do Idema e da Caern, além de se promover uma audiência pública com os moradores do bairro. “São três coisas descabidas. Quem tem que dar a licença é a Semurb e não o Idema. E quanto à Caern, ela tem que fazer o saneamento e pronto. Já sobre as audiências, é pior. Você compra um terreno, aí pra construir um prédio, tem que comunicar a todo mundo”.

Silvio Bezerra diz que as construções que poderiam ser instaladas ali, trariam um desenvolvimento da região, o que melhoraria a qualidade de vida dos moradores. Tudo isso com a vinda de grande empresas e mais empregos. Além disso, ele condena o que chama de retirada dos direitos do cidadão, em relação aos critérios para a venda de lotes. “A pessoa deve ter o direito de decidir sobre sua vida, se quer vender seu terreno ou não”.

Silvio Bezerra informou que pretende presenciar as discussões na Câmara Municipal, a fim de expor suas idéias. “Queremos encontrar um meio termo. Eu vou lá para argumentar. Não adianta discutir com a emoção”.

Entrevista: Maria Helena Correia, moradora

Dona Maria Helena Correia está na Vila de Ponta Negra desde que nasceu. Se criou entre os pescadores e agricultores daquela que era uma região praieira distante de tudo. Quando era menina, cansou de ir à pé para o Centro, nos tempos em que a condução era algo inimaginável. Hoje, aos 64 anos, está no mesmo lugar, na rua Manoel Coringa de Lemos, a principal da Vila.

Dona Helena atualmente é referência cultural da localidade. Faz renda de bilro, dança no pastoril, canta, representa e é admirada na comunidade. Para ela, não há dinheiro no mundo que valha à pena sair da Vila. E ela resiste, na mesma casa, apesar de já ter perdido a vista para o Morro do Careca. Hoje, restou-lhe alguns metros da vista do mar, que já é ameaçada pelo anúncio da construção de mais um prédio. Mas ainda assim, ela não sai.

Quando a senhora começou a perceber que a Vila já não seria a mesma?

Maria Helena: Ah, isso já faz é muito tempo. Já faz mais de quarenta anos. Na verdade, desde que chegou o conjunto, já começou mudar. Já foi chegando mais gente. Porque a gente nunca imaginou que a Vila fosse ficar desse jeito. É tanto que as casas eram tudo na beira da pista. As pessoas daquele tempo eram muito inocentes. Era um pouco quieto. Tendo o dinheiro pro pão de cada dia, tudo tava bom...

E qual o temor do pessoal, sobre o que pode acontecer daqui pra frente?

MH: Eu acho assim, que o maior temor da gente é eles tirarem mesmo. É eles tomarem conta de tudo. A “gringaiada” tá tomando conta de tudo. Aqui na rua a gente conta os nativos que tem. Muitos deles foram lá pro final das ruas ou pra outros bairros. O desenvolvimento até tem sido bom, mas aquela tranqüilidade acabou. Mas nem por isso eu deixo de gostar do meu ninho, não.

E desses nativos que vão embora, a senhora será mais uma?

MH: Não, senhor. Pelos meus planos eu vou ficar aqui. Meu esposo às vezes diz: “se eu arranjar um bom dinheiro, eu vou embora”, Eu digo, vou nada. Deixa fazer os prédios. Dinheiro pra mim é apenas um complemento da minha vida.

O Conjunto de Ponta Negra foi regulamentado pela lei 4.328/93

. 707, 16ha é a área do bairro de Ponta Negra
. 6.227 é o total de domicílios particulares
. 23.600 era o total da população, no ano de 2000
. 30.212 era a estimativa da população para 2005
. 42,72 hab/ha era a estimativa da densidade demográfica (2005).
. 3,76 é a média de moradores por domicílio
. 123 casas têm rede de esgoto
. 5.527 casas tem fossas séptica
. 794 residências tem fossas rudimentares
. 5.440 ligações de esgotos registradas
. 37.770 ligações de água pela Caern
. 9.574 são consumidores de energia elétrica (dados da Cosern)

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