‘‘Muita gente em Natal consome água imprópria’’
Repórter: Bruno Vasconcelos
Foto: Ana Amaral/DN
Conhecida e reconhecida por ter o ar mais puro das Américas, Natal também se orgulhou por muitos anos da qualidade de sua água, potencialmente potável. Mas na última década, o crescimento imobiliário desordenado, somado à falta de esgotamento sanitário, causaram a contaminação do aquífero - principal fonte de abastecimento da cidade - por nitrato, o que está fazendo com que muitos natalenses tenham que beber água imprópria para o consumo humano.
A promotora Gilka da Mata (foto) classifica a contaminação da água de Natal como sendo o maior desafio para a sociedade e para o Ministério Público, que já enfrentou várias lutas para defender uma água de qualidade para a ‘Cidade do Sol’.
Uma das novidades sobre o assunto, segundo a promotora, é a denuncia de que o Hospital Giselda Trigueiro, que é administrado pelo estado, estaria jogando resíduos hospitalares em uma fossa, o que é proibido e pode contaminar o lençol freático. ‘‘Existe uma regulamentação própria para o destino de resíduos hospitalares’’, ressalta Gilka da Mata, que já pediu uma vistoria no hospital para constatar possíveis irregularidades.
Diário de Natal: Qual o principal problema hoje relacionado a água de Natal?
Gilka da Mata: Hoje temos um fator que influencia diretamente a população, que é a questão da contaminação da água. Em razão disso, a água que é distribuída para a população deixa de ser potável, o que afeta diretamente a saúde da população. A causa da contaminação é basicamente a falta de infra-estrutura de saneamento na cidade. Esse é o nosso maior problema.
Esse seria também o maior desafio?
O grande desafio é saber de onde a gente vai tirar a água para abastecer a população da cidade. Hoje, o abastecimento é predominantemente realizado através de aquíferos (lençóis freáticos). A solução encontrada pela Caern foi fazer a diluição da água contaminada do aquífero com água de manancial superficial. Na Zona Sul, da Lagoa do Jiqui e na Zona Norte, da Lagoa de Extremoz. Mas temos um grave problema porque a cada dia, com o crescimento da cidade, a demanda aumenta e as duas lagoas já estão no máximo de suas capacidades. Com isso, a água das lagoas não está chegando mais em quantidade suficiente para garantir a diluição. Então essa água está chegando em vários pontos da cidade, contaminada, imprópria para o consumo humano.
A situação é ruim em toda a cidade?
Dos oito reservatórios de abastecimento de água da Caern, três estão contaminados e os outros estão próximos ao nível de contaminação. O que é muito grave. E estes reservatórios abastecem os bairros mais populosos de Natal, como Lagoa Nova, Quintas e Felipe Camarão. Além disso temos problemas sérios de contaminação nos poços nos bairros de Pirangí, Gramoré e Pajuçara, onde a água vai para os reservatórios e não é diluída. Com isso, a contaminação chega à níveis altíssimos e a água deixa de ser potável, imprópria para o consumo humano. E muita gente em Natal consome água imprópria.
O que o Ministério Público está fazendo em relação a esse problema da contaminação?
As soluções a longo prazo e médio prazo envolvem necessariamente um sistema de esgotamento sanitário. Mas enquanto esse sistema não vem, nós não podemos deixar que a população continue tomando água imprópria para consumo. Aí vem aquele questão: ‘De onde vamos captar água?’. Tem que ser de mananciais que tenham qualidade e quantidade. Para Zona Norte, a Caern pensa na região do Rio Doce, onde já foram perfurados alguns poços e foi constatado que tem condições para abastecer a região. Na Zona Sul, a região da Lagoa do Jique também tem potencial de abastecimento por poços. Só que nestes casos é preciso construir adutoras. O que o Ministério Público fez foi entrar no ano passado com uma ação judicial contra a Caern exigindo essas medidas emergenciais, mas que ainda não foi apreciado pelo juizo.
O Poder Judiciário tem dado a mesma importância ao assunto ‘‘água’’, como é dado pelo Ministério Público?
Nós enfrentamos um problema com o Poder Judiciário, principalmente nas demandas que envolvem estado e municípios, porque entram na mesma vala comum da Vara da Fazenda Pública. E os juizes não são especializados na matéria. Hoje em dia, a questão ambiental tem que ser priorizada em todas as esferas: Nos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Hoje, o Ministério Público em Natal tem uma promotoria específica do Meio Ambiente, com quatro promotores. Já o judiciário tem uma vara que não é totalmente especializada, que é a 18ªVara Cível, mas que envolve falências e meio ambiente, duas coisas que não têm nenhuma relação. A gente precisaria ter uma vara especializada na questão ambiental.
E como a população pode contribuir para garantir uma água de qualidade em Natal?
A sociedade precisa se conscientizar que também pode e deve ajudar. Coisas simples, como o racionamento de água e cuidados com a limpeza da fossa de casa são fundamentais para garantir que Natal possa ter sempre uma água potável de qualidade. O Ministério Público lança amanhã (hoje) uma cartilha (encartada hoje no Diário de Natal) que traz dicas de como proceder em relação ao esgoto de casa e a importância desses cuidados para a saúde da família.
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