URBANISMO
OS PRÉDIOS EM CONSTRUÇÃO PRÓXIMOS AO MORRO DO CARECA SÃO LEGAIS?
Não
“Uma obra pode ser considera legal apenas porque atende as regras do Plano Diretor? A resposta é não”, Gilka da Mata, promotora de Justiça
A competência para criação de leis de proteção ao Meio Ambiente é tanto da União, quanto dos Estados e dos Municípios. A União estabelece as normas gerais, através de Leis Federais, cabendo aos Estados e Municípios apenas suplementá-las. (arts. 24 e 30 da Constituição Federal). A Lei Federal 6938/81 estabelece as normas gerais sobre o licenciamento ambiental e a obrigatoriedade deste para atividades potencialmente poluidoras.
Esta Lei, que deve ser rigorosamente seguida pelos Estados e Municípios, inclui no conceito de poluição a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente.
Também, estabelece como instrumento de controle ambiental a avaliação dos impactos ambientais. Essa avaliação é tão importante que a Constituição Federal incumbiu ao Poder Público exigir, na forma da lei, e com ampla publicidade, o estudo prévio de impacto ambiental (art. 225, º1º, III).
O conceito legal de impacto está associado à alteração do meio ambiente causada por qualquer atividade humana que direta ou indiretamente afete: 1. a saúde, a segurança e o bem estar da população; 2. as atividades sociais e econômicas; 3. a biota; 4. as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente e 5. a qualidade dos recursos ambientais. (Resolução 1/86 CONAMA)
Levando em conta a análise dos impactos, principalmente estéticos, é fácil constatar que um empreendimento vertical nas proximidades do Morro do Careca é ilegal, porque degrada, de modo irreversível, a visão cênica desse recurso paisagístico que identifica a cidade e que é um patrimônio ambiental de uso comum do povo.
Também, causa impactos adversos para a sócio-economia da cidade, que depende da paisagem natural para auferir renda com a atividade turística. Nos termos da Lei Federal 6.513/77, o Morro do Careca pode ser considerado uma Área Especial de Interesse Turístico, da categoria de paisagem notável.
O local constitui-se em um dos monumentos naturais mais representativos da Zona Costeira, que por sua vez, é considerada Patrimônio Nacional pela Constituição Federal. A Lei Federal 7661/88, também, determina a realização do estudo de impacto ambiental para a instalação de atividades que possam alterar as características naturais da Zona Costeira.
Com essas premissas, questionase: uma obra pode ser considerada legal apenas porque atende as regras do Plano Diretor?
A resposta é não, porque todos os enunciados da Constituição Federal e todas as determinações da legislação federal ambiental precisam ser obedecidos pelo Município. O Plano Diretor é um instrumento essencial para a política urbana; todavia, esse instrumento sempre esteve muito atrelado ao ordenamento territorial sob a ótica da arquitetura e do urbanismo, sem a devida consideração da legislação ambiental.
A filosofia que deve prevalecer em um Plano Diretor moderno é a de compatibilizar as prescrições urbanísticas com as normas de proteção ambiental. E é essa a orientação do Estatuto da Cidade, Lei Federal 10.257/2001, que determinou que o planejamento da cidade seja voltado para evitar e corrigir distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente e enfatizou o estudo prévio de impacto ambiental como instrumento da política urbana.
Em todo o caso, as questões de ordem urbanística só devem ser consideradas após a análise das questões ambientais. Uma indústria para se instalar, por exemplo, não basta estar prevista para ser edificada no Distrito Industrial da cidade. Antes, a indústria precisa comprovar, durante o licenciamento ambiental, que não causará impacto ao meio ambiente com as atividades que exercerá.
Sim
“Toda e qualquer edificação promove uma agressão ao meio, por menor que seja. Não há crescimento sem descaracterização mínima”, Waldemir Bezerra, presidente do Creci
Os prédios são legais porque foram concebidos de acordo com a legislação vigente, que é o Plano Diretor da cidade de Natal, contemplando a construção de prédios naquela área, chamada de Zona de Adensamento Básico (ZAB). Está dentro do que está permitido em altura e em quantidade de unidades, respeitando a legislação vigente.
O Plano Diretor norteia, disciplina todas as construções. Os empreendimentos, sob o aspecto legal, estão cumprindo rigorosamente o que é permitido pelo documento.
Diga-se de passagem que muitas vezes as situações são legais, mas são imorais. Não é o que acontece neste caso. O que está sendo objeto de questionamento é o posicionamento dos prédios, argumentam que ele prejudicaria sua visualização, sua paisagem.
Negativo.
Eles estão à direita da Rua José Bragança, limite divisor da ZAB da Zona Especial de Interesse Turístico (ZET 1), esta sim, região demarcada para preservar a visão do entorno do Morro do Careca, com limite de gabarito de 7,5m. Isso não foi discutido por leigos, apesar da também participação da sociedade, ou mais especificamente, da comunidade de Ponta Negra nos debates sobre o Plano Diretor de 1994.
A discussão durou mais de um ano, todos respaldados por pareceres de especialistas. O projeto foi aprovado na Câmara Municipal e sancionado pelo então prefeito. Não teve nenhum atropelo.
Defendemos de forma intransigente as questões que dizem respeito ao meio ambiente porque nós não vendemos concreto, não vendemos ferro, nem cimento, nem cal. Vendemos qualidade de vida. E qualidade de vida passa pelo contemplativo, pelo belo, pela paisagem, pela visualização, a qualidade do nosso clima, da nossa água, enfim, pelas belezas naturais que Deus preparou para usufruirmos a milhões de anos.
Temos como símbolo que representa a nossa categoria o colibri (beijaflor), que representa a liberdade e a beleza. A ave que tem o maior coração em proporção ao seu corpo. A cidade feia, descaracterizada e marginalizada não será vendida pelos corretores de imóveis.
Com certeza os arquitetos dos empreendimentos são profissionais com mais de vinte anos de mercado, com mestrado, alguns com especialização em questões ambientais. Deram o melhor de si ao se debruçarem sobre os projetos. O arquiteto, antes de tudo, é um artista sensibilizado com as questões ambientais.
Ele tem que vislumbrar sua obra já prevendo que não haja nenhum dano grave à natureza, sem descaracteriza-la. Toda e qualquer edificação promove uma agressão ao meio, por menor que seja. Não há como promover crescimento sem uma descaracterização mínima.
Mas a questão em foco é a visão do ícone maior de nossa cidade, o Morro do Careca. A pergunta é: os prédios impedem a visão da careca do morro? Claro que não. As fotos que costumeiramente são tiradas para os cartões postais não me deixam mentir.
Quanto ao esgotamento sanitário, há um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) celebrado entre o Ministério Público, Prefeitura, Caern e o empresariado. Se o poder público não fizer o devido trabalho de esgotamento sanitário, há soluções técnicas modernas para a construtora fazê-lo no próprio local do empreendimento.
Mesmo assim, foi noticiado nos jornais que as obras estavam atrasadas e deveriam estar prontas em seis meses. Porém, as edificações próximas ao morro só serão utilizadas após a sua conclusão definitiva, algo previsto para dois ou três anos. Para concluir, enfatizo novamente que estou do lado da defesa do meio ambiente, da natureza e do belo.
Também sou um seguidor da lei e tenho a absoluta convicção que seguimos rigorosamente a sua letra nesse caso.
BOCA DO POVO
"Sou a favor da geração de emprego e renda na Vila de Ponta Negra. Se a Prefeitura permitiu a construção e, se por acaso as licenças forem anuladas, quem vai pagar a idenização são os próprios contribuintes. Dinheiro público para pagar por um erro da própria Prefeitura é demais", Domício Fernandez, empresário, 45, Vila de Ponta Negra
"A Semurb deu a licença baseada no Plano Diretor e estava tudo dentro da legalidade. Se a lei não garantir mais nada estamos perdidos. Essas obras vão diminuir o desemprego que é muito grande na Vila de Ponta Negra. Taxistas, manicures, cabeleleiros, por exemplo, serão beneficiados quando as obras forem concluídas", Evo Fernandes, 56, aposentado, Vila de Ponta Negra
"O morro é nosso patrimônio. Se começarem a construir ao lado dele os problemas daqui vão aumentar. Já não bastasse o abandono que é a Vila no que diz respeito à questão da droga e da prostituição ainda querem encher isso aqui de prédios? Existem coisas mais importantes a serem feitas", Francisco de Assis Lima, 49, funcionário público, Vila de Ponta Negra
"A maioria das pessoas da Vila de Ponta Negra trabalha na informalidade e as obras vão ajudar a sair dessa situação. Sem empreendimento não tem emprego. A visão do Morro do Careca na verdade é para quem está na Via Costeira. Mas queremos analisar o projeto para ver a questão do esgotamento sanitário", Maria do Carmo Costa, 47, vendedora ambulante, Vila de Ponta Negra
"O poder público tem que se preocupar em trazer qualidade de vida para os habitantes do nosso bairro. As obras só vão atender aos interesses dos estrangeiros. Depois que elas estiverem prontas ninguém vão aprofundar os problemas já existentes aqui como prostituição e saneamento", Wallace Monteiro, 45, marceneiro, Vila de Ponta Negra
"Os prédios são ilegais no aspecto ambiental. Podem até ter sido autorizados urbanisticamente, porém o conjunto de impactos que um prédio como esse pode causar não foi contemplado. Infringe as leis federais de meio ambiente. A Semurb deveria criar um selo verde, similar ao ISO 9000, com todos os rigores que esse tipo de documento prevê", Yuno Silva, 31, jornalista, Nova Descoberta
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